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CADE manifesta possível mudança de entendimento na cobrança de THC2

Recentemente, o presidente do CADE falou ao jornal VALOR que uma Nota Técnica será publicada apontando a legalidade da cobrança, até então chamada de THC2, cobrança esta que até então o CADE era contrário.

Segundo informou, a mudança foi consequência da Resolução Normativa 34 da ANTAQ que saiu em agosto de 2019. A Resolução descreve os Serviços de Segregação e Entrega de Container, popularmente conhecido como TCH2, o diferenciando da então chamada THC – Terminal Handing Charge ou Taxa de Movimentação no Terminal.

O assunto é fruto de discórdia entre operadores portuários e os recintos alfandegados de zona secundária, ou terminais retroportuários como conhecidos, originando diversas disputas judiciais ao longo dos anos, onde o CADE vinha interferindo com a aplicação de multas por concorrência desleal.

Mas o que seriam exatamente estas taxas e qual o motivo da briga?

A Taxa de Movimentação no Terminal (THC) consiste no valor cobrado pelo operador portuário ao armador para a movimentação vertical de cargas, ou seja, entre o portão do terminal portuário e o costado da embarcação.

A taxa faz parte do Box Rate, pacote de serviços cobrados do armador que é repassado ao seu cliente junto com o frete, isso porque após o operador portuário ter se tornado privado, é o armador quem escolhe o terminal portuário que irá utilizar.

Ocorre que, na importação, essa movimentação depende também de desembaraço aduaneiro, que por muitas vezes não consegue ser sincronizada de maneira tal que o contêiner possa sair diretamente do navio para o veículo no portão do terminal, necessitando aguardar em recintos alfandegados até sua liberação ou logística.

Os operadores portuários também oferecem o serviço de recinto alfandegado (Lei 12.815/2012 – Lei de Portos, art.2º,XII), assim como existem outros recintos fora do que se chama zona molhada do porto, ou seja, na zona secundária, e é neste momento que nasce a segunda taxa, o THC2 e as brigas começam.

Cobrada diretamente pelos operadores portuários que afirmam a existência de despesas extras para levar os contêineres até a zona secundária, o que não estaria abrangido pelo THC, acaba enfurecendo os recintos alfandegados externos que afirmam serem lesados por uma cobrança extra, alegando que não existe serviço adicional que justifique a cobrança de uma tarifa extra.

Com a diferença do valor extra cobrado, os recintos externos dizem sofrer prejuízos na concorrência com os terminais, uma vez que estes apresentam preços mais atrativos.

O CADE vinha endossando o coro dos recintos externos, multando os terminais por concorrência desleal, que por sua vez eram declarados inexigíveis pelos Tribunais Federais, fundamentando que o serviço possuía justificação operacional e regulamentação pela ANTAQ.

Nos Tribunais Estaduais o assunto não encontra pacificação, com julgados que entendem pela legalidade e pela ilegalidade da cobrança.

A ANTAQ já havia tratado no assunto na Resolução nº 2.389/2012 quando descrevia em seu art. 2º, VII o que seria a Taxa de Movimentação no Terminal:

 

Art. 2º Para os efeitos desta Norma, considera-se:

(…)

VII – Taxa de Movimentação no Terminal (Terminal Handling Charge – THC) preço cobrado pelo serviço de movimentação de cargas entre o portão do terminal portuário e o costado da embarcação, incluída a guarda transitória das cargas até o momento do embarque, no caso da exportação, ou entre o costado da embarcação e sua colocação na pilha do terminal portuário, no caso da importação, considerando-se, neste último caso, a inexistência de cláusula contratual que determine a entrega no portão do terminal;

 

Observe que a resolução não inclui a movimentação até os recintos alfandegados, dentro ou fora da zona primária; ela é clara ao dizer que se inclui a movimentação entre a entrada do terminal e o costado da embarcação apenas para a exportação, enquanto na importação ela se finda com a colocação na pilha do pátio do terminal.

Este é o ponto no qual divergem operadores e terminais retroportuários. Se somente os operadores são autorizados a movimentar as cargas dentro do terminal portuário, obviamente que o serviço não se encerraria com eles sendo depositados na pilha no pátio, devendo ser encaminhados ou ao portão do terminal ou ao recintos alfandegados, logo, este custo já teria sido pago através da THC que consta do Box Rate.

A antiga Resolução trazia em seu art. 3º a permissão para a inclusão da cobrança de THC no Box Rate e abria a possibilidade da cobrança de outros serviços em seu art. 5º, ao trazer que aqueles não contemplados pelo Box Rate fossem prestados obedecendo as condições e remuneração livremente negociadas.

Como a Resolução não trazia exatamente a previsão da cobrança de THC2, mas deixava em aberto a possibilidade de outras cobranças, ela não foi capaz de acabar com as controvérsias geradas, levando à edição da Resolução Normativa 34/2019.

Desta vez a Resolução, além de manter as definições anteriores, incluiu no seu artigo 2º a definição de Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres – SSE, que nada mais é do que o próprio THC2, o distanciando do THC original, assim descrito:

 

Art. 2º Para os efeitos desta norma, considera-se:

(…)

IX – Serviço de Segregação e Entrega de contêineres – SSE: preço cobrado, na importação, pelo serviço de movimentação das cargas entre a pilha no pátio e o portão do terminal portuário, pelo gerenciamento de riscos de cargas perigosas, pelo cadastramento de empresas ou pessoas, pela permanência de veículos para retirada, pela liberação de documentos ou circulação de prepostos, pela remoção da carga da pilha na ordem ou na disposição em que se encontra e pelo posicionamento da carga no veículo do importador ou do seu representante;

 

A Resolução ainda deixa expresso a autorização da cobrança do SSE em seu artigo 6º, §1º, bem como de que ele não faz parte da cesta de serviços e nem daquelas despesas que são ressarcidas por meio do THC em seu artigo 9º.

Diante deste quadro não restou ao CADE alternativa outra que não fosse seguir o que previsto por meio da agência reguladora competente.

Contudo, a Resolução não é uma carta branca para que os terminais pratiquem formas abusivas de concorrência com cobranças desmedidas. Consta ainda da Resolução que práticas abusivas que visem dificultar a concorrência por meio do aumento abusivo de preços constituem infração passível de penalidade.

Caso fique constato tal abuso na cobrança, a ANTAQ poderá estabelecer o preço máximo a ser cobrado a esse título, uma vez que é de sua competência promover as revisões e os reajustes das tarifas portuárias” (Lei 10.233/2001, art. 24, inciso VII – Lei de Criação da ANTAQ)

Talvez fosse o caso da Agência, antes da expedição da resolução, ter efetuado estudo para estabelecer os parâmetros da cobrança de SSE/THC2 onde os valores cobrados fossem estabelecidos com base dos custos reais da operação, deixando margem suficiente para que a concorrência se desenvolvesse sem prejudicar os outros recintos.

Aos recintos alfandegados externos e demais usuários dos serviços cabem agora a fiscalização quanto aos preços praticados. Qualquer abuso por parte dos operadores portuários ensejam uma cobrança de atitudes por parte da ANTAQ, bem como o ressarcimento por eventuais danos causados em decorrência da conduta anticoncorrencial.

A expedição da Resolução Normativa 34/2019 diminuirá, mas certamente não encerrará a discussão.

 

Por Juliana Silva de Paula